segunda-feira, setembro 25, 2006

"Quebra de Patentes" - Ameaça à Pesquisa

Não se discute que o Programa Brasileiro da AIDS tem grandes méritos.

Os números disponíveis demonstram o sucesso do programa que ,segundo dados divulgados
pelo Ministério da Saúde, possibilitou uma economia, entre 1996 e 2002, de mais de R$ 2 bilhões para os cofres públicos.

Os dados do Ministério mostram, por exemplo, que diversos medicamentos estão sendo comprados hoje a preços significativamente menores quando comparados aos valores pagos no ano de lançamento.

Assim, verificamos que, até o ano de 2003, (1) o Nelfinavir teve seu preço reduzido em 56,5%, (2) o Lopinavir em 56,2%, (3) o Efavirenz em 77,4% e o Atazanavir em 76,4%.

Dados do mesmo Ministério, publicados pela Dra. Cristina Almeida e pelo Dr. Paulo Teixeira indicam que o governo economizou, entre 1996 e 2002, R$ 2,2 bilhões com o tratamento de HIV positivos, sendo R$ 1,2 bilhão em custos de hospitalização e de tratamento de infecções oportunistas, e R$ 960 milhões em descontos na compra de medicamentos antiretrovirais.

Mas os medicamentos que possibilitaram a economia acima mencionada não existiriam se a indústria de pesquisa não estivesse disposta a gastar dezenas de bilhões de dólares em pesquisa e desenvolvimento.

Vistos os dados acima, fica difícil entender porque, todos os anos, o Ministério da Saúde do Brasil
alardeia aos quatro cantos da terra que vai decretar a Licença Compulsória dos medicamentos patenteados, utilizados no programa.

O mote da ameaça é sempre o mesmo, ou seja: 3 medicamentos consomem mais de 60% do orçamento do Ministério para o Programa da AIDS. Os referidos medicamentos nem sempre são os
mesmos.

Mais difícil de compreender, senão como exercício de política paternalista, com fins eleitoreiros, é a tramitação na Câmara Federal de vários Projetos de Lei que transformam os medicamentos para AIDS em produtos não patenteáveis.

É preciso lembrar que foram justamente os Direitos de Propriedade Intelectual que ajudaram a
transformar a AIDS de “sentença de morte” em “doença crônica” tratável.

A pesquisa precisa continuar e precisa ser remunerada. Todos os que conhecem um pouco sobre a AIDS e o vírus HIV, sabem que este é extremamente mutante e requer pesquisas continuadas e
altos investimentos constantes na busca de novos medicamentos que substituam aqueles aos quais o vírus se torne resistente.
Sem a possibilidade de patentear o produto ou diante de real ameaça de licenciamento compulsório, quem vai se dispor a investir mais de US$ 800 milhões no desenvolvimento de novos produtos?

Que não se diga, como justificativa para aprovação do projeto, que a propriedade tem de servir à sua função social. A função social de uma patente é exatamente a transmissão do conhecimento, depois de recuperados, quando possível dentro do prazo legal, os investimentos despendidos na invenção do novo produto. Mais que isso, os descontos já concedidos ao governo e mencionados acima são cabal demonstração da consciência que as empresas têm de sua responsabilidade social.

O que incomoda nas repetitivas alegações do governo é a aparente falta de transparência sobre as verdadeiras razões para as ameaças e para a proposição dos diversos Projetos de Lei impedindo o
patenteamento de medicamentos para AIDS.

O governo não informa (com a mesma veemência com que defende a quebra de patentes), ao público ou à mídia, por exemplo, que o orçamento do Programa da AIDS para o ano de 2004 (cerca de R$
540 milhões) é quase 15% menor do que o orçamento do programa em 1999 (cerca de R$ 620 milhões) e que, como conseqüência, o orçamento do programa, que já foi 3,2% do orçamento do
Ministério, hoje representa apenas 1,8% do mesmo.

É importante que se saiba, ainda, que este orçamento menor foi suficiente para que em 2004 se tratasse o dobro do número de pacientes (155 mil) tratados em 1999 (76 mil).

Como se pode fazer alegações de Emergência Nacional em bases exclusivamente de custo, que, aliás, têm sido menor a cada ano, para justificar uma medida de exceção como o Licenciamento Compulsório de um direito de propriedade industrial garantido pela legislação brasileira e por tratados internacionais de que o Brasil é signatário?

Ou, pior que isto, o impedimento de se patentear os medicamentos? A justificativa fica ainda mais difícil, e questionável em termos éticos, quando, segundo dados divulgados pelo jornal “Folha de São
Paulo”, este mesmo governo gastou em propaganda R$ 525 milhões em 2004 e vai gastar R$ 620 milhões até o final deste ano. Um governo que gastou em propaganda em 2004 praticamente o
mesmo valor que gastou na compra de medicamentos para AIDS não pode achar que este valor é grande o suficiente para justificar a decretação de uma Emergência Nacional.

GAZETA MERCATIL – 08/06/2005

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