terça-feira, maio 13, 2008

Decisão Administrativa Vinculante ????

No dia 5 de maio, entrou em vigor a Resolução da Diretoria Colegiada da ANVISA, conhecida como RDC nº. 25/2008 (clique aqui), que trata do processamento dos recursos administrativos apresentados contra decisões, proferidas em primeiro grau, no âmbito da Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

No corpo da referida RDC, mais precisamente nos artigos 10 inciso V e parágrafo 2º e 19 a 27, a Diretoria Colegiada da ANVISA cria e regulamenta a "Súmula da ANVISA". Em resumo, as Súmulas da ANVISA representam enunciados que revelam "entendimento pacífico, reiterado e uniforme da Agência", e impedem o conhecimento de um recurso administrativo.

A "Súmula da ANVISA", quem sabe editada no esteio da Lei nº. 11.417/2006 que criou a "Súmula Vinculante" no âmbito do Supremo Tribunal Federal, padece de vícios que, por um lado, deixam transparecer a sua total ilegalidade e pelo outro, tentativa de impedir as partes, em processos administrativos na Agência, de se socorrerem completamente do direito à exaustão do princípio do contraditório (ampla defesa) e, portanto, prejudicando o devido processo legal.

Uma Resolução, conforme definição encontrada no Dicionário Jurídico De Plácido e Silva, é um ato pelo qual a autoridade pública toma uma decisão, impõe uma ordem ou estabelece uma medida. O mesmo Dicionário nos ensina que as resoluções dizem respeito a questões de ordem administrativa ou regulamentar.

Pelo princípio da legalidade, as autoridades administrativas não podem emitir atos que não sejam condizentes com a lei. De acordo com esse princípio, citado no artigo 37 da Constituição Federal, o particular pode fazer tudo que a lei não proíbe, já o administrador público só pode fazer aquilo que a lei expressamente permite.

Verificamos que, nas justificativas para a edição da RDC 25/2008, a Diretoria Colegiada da ANVISA faz referência à Lei nº. 9784/1999, "que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, visando, em especial, à proteção dos direitos dos administrados e ao melhor cumprimento dos fins da administração".

Ora, a própria Lei nº. 9784/1999 antes citada, limita, em seu artigo 63, as hipóteses em que a administração pública federal pode deixar de conhecer um recurso. São quatro hipóteses e, nenhuma delas trata do não conhecimento de recurso porque a decisão recorrida estaria em consonância com o conteúdo de Súmula, vinculante ou não, emitida pelo próprio órgão administrativo que deve examinar o recurso.

Como o administrador público só pode fazer o que a lei expressamente permite e, neste caso a lei estabelece expressamente os casos em que a administração pode deixar de conhecer um recurso, é vedado à ANVISA, ou a qualquer outro órgão da administração federal criar uma quinta hipótese.

Como se verifica são totalmente ilegais os artigos 10 inciso V e parágrafo 2º e 19 a 27 da RDC 25/2008 da ANVISA que entrou em vigor no dia 5 de maio.

Por que o Brasil resiste à inovação?

Assunto insistente para alguns, polêmico para tantos e essencial para toda a nação: quem deve pagar pela demora da análise das patentes de produtos químico-farmacêuticos? Certamente não podem ser avaliados apenas os interesses de um lado. Para que o brasileiro discuta esse tema com propriedade, é preciso apresentar fatos e argumentos.

No topo da lista dos problemas que trazem essa discussão à tona figura a demora no processo de análise dos pedidos de patentes, que chega a até 10 anos no Brasil. Nos outros países, essa média é de cinco anos, a depender da complexidade do objeto analisado. O que faz com que o Brasil demore até o dobro da média dos demais países?

O exame desses pedidos é lento por natureza. Trata-se de um processo extremamente técnico, envolvendo profissionais especializados. Deve-se levar em consideração, para o reconhecimento de uma patente, três critérios fundamentais: novidade, atividade inventiva envolvida e possibilidade de aplicação industrial. No caso das indústrias químicas e farmacêuticas, pela própria aplicação dos objetos e complexidade, este processo não tem como ser rápido. Dez anos, porém, está além do que se justifica esperar. O próprio Ministério da Saúde, recentemente, reconheceu isso.

Saem prejudicados nesta demora, principalmente, os depositantes de patentes que correm o risco de, durante o longo tempo de espera pela aprovação, ter seu objeto desrespeitado por terceiros, não dando aos investidores, portanto, a segurança jurídica necessária.

Um depósito de uma patente cria para o depositante o que se chama de “uma expectativa de direito”; ou seja, ele terá direito ao período de exclusividade para o seu produto, pelo prazo legal, contado da data em que efetuou o depósito da patente perante o INPI. Devido à demora e à complexidade envolvidas no processamento de um pedido de patente, o produto objeto daquele pedido pode já estar no mercado há vários anos quando a patente for finalmente concedida ou negada. Importante lembrar que, passados os primeiros 18 meses da data do depósito, os processos de patentes são públicos e podem ser vistos por qualquer interessado que também pode tentar impugná-los.

Como, então, se fazem negócios com produtos cujas patentes estão ainda pendentes de concessão?

Normalmente, se o comprador/vendedor de um produto cujo pedido de patente está sendo não arrisca a compra/venda do produto de um terceiro qualquer, dentro ou fora do país –conforme o caso - é porque o comprador/vendedor tem fortes razões para acreditar que se trata de um produto, cujo pedido de patente é sólido e, portanto, com enormes chances de concessão.

Se não fosse assim, o comprador/vendedor poderia correr o risco pois, mais tarde, a patente não seria aprovada, e ele não teria de ressarcir o detentor da patente pelas perdas e danos causados pela violação daquela patente.

Trata-se, portanto, de uma aposta que fazem tanto o comprador quanto o depositário da patente. O pedido, por si, não gera nenhum direito – mas a expectativa de que ele venha a ser reconhecido sim. Todo terceiro (isso inclui o próprio Governo) que adquire freqüentemente mercadorias em processo de análise de patente (como a de medicamentos), acaba por assumir algum risco quando resolve apostar ou não na validade do objeto do pedido de patente depositado.

Voltemos, agora, ao cerne do problema: a lentidão no processo de aprovação dos pedidos de patente. É justo, antes, citar que nos últimos anos o INPI – Instituto Nacional de Patentes Industriais, responsável por essa análise, tem se esforçado significativamente para agilizar seus processos. Seja na reforma da sua infra-estrutura, contratação de pessoal qualificado ou na mudança do sistema, é preciso destacar o esforço do atual presidente do instituto, Jorge D’Ávila, em otimizar as análises dentro do INPI.

Há, porém, um fator, específico, que dificulta significativamente este processo, tornando-o ainda mais longo, ainda que haja um esforço do INPI para agilizá-lo. Trata-se do instituto da Anuência Prévia pela ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária, criada pelo artigo 229 C da Lei de Propriedade Industrial. Com ele, os pedidos de patentes de produtos farmacêuticos, após analisados por uma equipe altamente especializada, inclusive composta por químicos e farmacêuticos, são obrigados a passar também por uma anuência prévia da ANVISA. Por que um pedido de patente deve passar por dois órgãos do mesmo Governo, quando apenas uma deles, neste caso o INPI, é o competente para esse fim?

Ao INPI cabe a análise dos pedidos de patente, julgando os critérios básicos através de uma análise técnica cuidadosa. À ANVISA, por sua vez, caberia apenas o papel de analisar se o que está no mercado oferece algum risco à população, exercendo se preciso seu poder de polícia através da punição aos que descumprem suas determinações legais ou impedindo o registro de produtos que não comprovem benefício efetivo. Não se discute aqui o papel fundamental da ANVISA, mas se questiona a necessidade de sua entrada num processo cuja responsabilidade pertence apenas ao INPI, com competência para julgar se o pedido de uma patente é lícito ou não. Com os dois órgãos fazendo o mesmo trabalho, é como se o tempo de análise fosse praticamente dobrado de forma desnecessária.

É preciso também lembrar, mais uma vez, que todo processo de análise de patente é público a partir do 18o mês após o depósito. Qualquer terceiro interessado em contesta-lo com argumentos plausíveis pode intervir. Com tamanha transparência, não se justifica o consumo dobrado de tanto tempo e recursos.

Não se pode criar aqui figuras de vilões ou heróis, beneficiados ou preteridos, já que a lei é justa com todos. Há uma clara necessidade, apenas, de que os direitos de propriedade dos objetos que demandam muitas vezes anos de pesquisa e investimento sejam defendidos. Esse deve ser mais do que um papel da lei – deve ser uma exigência de todos os envolvidos no mercado.

Todos ganham com o bom funcionamento dessa engrenagem: desde o fabricante, que tem seu direito preservado e retorno financeiro garantido, até o consumidor final, que tem acesso aos mais diversos produtos fabricados com uma tecnologia que pode desde tornar mais barato e eficiente um combustível até produzir medicamentos capazes de curar doenças e salvar vidas. Neste caso, tempo é mais que dinheiro perdido – torna pessoas reféns de um sistema burocrático, lento e nem sempre justo em suas análises movidas, ás vezes, mais por questões políticas derivadas de reações emocionais.